AS LUTAS DO POVO BRASILEIRO: A Revolta de Canudos (1896-97)

   Canudos ficava no nordeste da Bahia, no vale do rio Vaza-Barris, em pleno sertão baiano. O movimento está diretamente ligado às condições econômicas do Nordeste. Até então, o latifúndio, a monocultura que utilizava técnicas rudimentares caracterizavam a estrutura rural brasileira. A modernização da produção açucareira, que resultou da introdução de usinas no Nordeste, expulsou milhares de camponeses de suas terras, ao mesmo tempo em que a seca e o surto da borracha levaram a uma grande migração da população para a Amazônia. Uma das formas de enfrentar a superexploração, a miséria e a fome foi a constituição de grupos de cangaceiros e jagunços em torno de líderes místicos, para poder resistir à opressão da estrutura latifundiária. Embora, originalmente, cangaceiros e jagunços tivessem sido contratados pelos coronéis para protegê-los, não foram poucos os casos em que passaram a contestar a ordem estabelecida, colocando em pânico os grandes proprietários.

    Os movimentos populares de cunho religioso eram outra forma de contestar a miséria, através da luta pela salvação. A religiosidade popular se contrapunha ao rígido catolicismo, que não respondia aos anseios mais imediatos da população. Por volta de 1893, já havia se reunido no arraial de Canudos um núcleo considerável de fiéis seguidores do beato Antônio Conselheiro, que pregava a salvação para quem o seguisse. Em 1896, o arraial possuía 20 000 habitantes, que viviam de modo semelhante ao das comunidades primitivas cristãs, repetindo a iniciativa dos habitantes dos antigos quilombos existentes na região. Possuíam pequenas plantações e criavam animais para atender a suas próprias necessidades e faziam trocas com vilas próximas, a fim de obter bens não produzidos no arraial. Para se protegerem, organizavam milícias armadas, nas quais se destacou o comandante Pajeú, líder de duas vitórias contra as expedições militares do governo.

   Com o rápido crescimento de Canudos, a Igreja tradicional perdia adeptos, e os latifundiários careciam de mão-de-obra. Acusados de desejarem restabelecer o regime monárquico, os sertanejos de Canudos passaram a sofrer violenta campanha governamental. Intelectuais da época, influenciados por uma visão elitista, condenavam em artigos enviados para os jornais o “fanatismo” e a degenerescência dos habitantes do arraial. O governo da Bahia organizou, inicialmente, duas expedições militares para dispersar o núcleo de Canudos. A primeira, comandada pelo tenente Manuel Pires Ferreira, era composta por 100 homens e terminou desbaratada pelos estrategistas do arraial, Pajeú e João Abade, que organizavam a resistência dos sertanejos. A segunda expedição, com aproximadamente 600 homens comandados pelo major Febrônio de Brito, tentou fazer nova investida contra o povoado, mas também acabou derrotada. Os sertanejos conseguiram se apoderar das armas dos soldados e, desse modo, ganharam ainda mais capacidade de resistência e defesa do arraial.



  No Rio de Janeiro e outras cidades, as notícias eram transmitidas sob a ótica dos grandes latifundiários. Para a população, Canudos aparecia como um antro de assassinos, monarquistas e fanáticos. Organizou-se uma terceira expedição, cujo comandante, coronel Moreira César, morreu em combate e na qual seus subordinados foram derrotados. O problema passou então às mãos do ministro da Guerra, Carlos Bittencourt, que preparou uma quarta expedição, com 10 000 homens fortemente armados. Depois de três meses de cerco e munidos de canhões, os soldados invadiram o arraial. A última expedição degolou mais de 8000 caboclos, incluindo mulheres e crianças. Não foi feito um único prisioneiro. No Rio de Janeiro, o presidente preparava a festa da vitória. A opinião pública começava a mudar em relação a Canudos, tendo contribuído para isso a heróica resistência de seus habitantes. Os alunos da Faculdade de Direito da Bahia recusaram-se a participar das comemorações da vitória e exigiram explicações sobre a ausência de prisioneiros. Rui Barbosa criticou o governo no Senado e, mais tarde, Euclides da Cunha denunciaria a chacina no livro Os Sertões.

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