História da Filosofia: As origens da Escolástica e da Filosofia Medieval


PASSAGEM DA ANTIGUIDADE PARA A IDADE MÉDIA

Com a crise do século III teve início a lenta de cadência do Império Romano, que culminaria com a queda de Roma nas mãos dos bárbaros em 476. Com o fim das guerras de conquista e o colapso do modo de produção escravista a economia entrou em declínio. O sistema de colonato que passou a ser utilizado já trazia, embrionariamente, a servidão feudal. O comércio entrou em decadência e as cidades foram se despovoando. A economia regredia, lentamente, para uma produção de subsistência. A redução na arrecadação tributária e o custo das legiões e de uma vasta burocracia corroíam ainda mais as finanças públicas e faziam crescer a inflação. As invasões bárbaras acentuaram ainda mais a retração da atividade comercial e o êxodo urbano, acelerando a ruralização da economia e da sociedade. O poder imperial foi, também, se debilitando, enquanto se sucediam as rebeliões militares e os golpes palacianos que substituíam imperadores.
Em 330 a capital foi transferida para Bizâncio e, no fim do século IV o Império foi dividido: Ocidente e Oriente. No século seguinte o Império do Ocidente desintegrava-se em vários reinos bárbaros, dos quais o mais importante foi o reino franco que originou o Império Carolíngeo, uma tentativa de reconstruir um poder imperial forte. Mas a Europa ocidental caminhava, inexoravelmente, para uma época de descentralização e fragmentação do poder político. Do processo de decomposição do mundo antigo nascia o mundo medieval. Da fusão de elementos da cultura romana com elementos trazidos pela cultura dos bárbaros germânicos surgiria uma nova estrutura econômica, social e política na Europa: o feudalismo.
Na verdade, a única força organizada que emergiu nesse verdadeiro caos que marca o fim do mundo antigo, na Europa ocidental, foi a Igreja. O cristianismo, que difundira-se inicialmente junto às massas de escravos e excluídos, acabou assimilado pelas próprias elites. Depois de três séculos de perseguições o cristianismo foi liberado e acabou tornando-se a religião oficial do Império. A organização da Igreja, a partir de então, foi estruturando uma instituição cada vez mais autoritária e hierarquizada. Num processo muitas vezes violento foram eliminadas as dissidências internas (de seitas consideradas heréticas) e reprimidos os resquícios de rituais pagãos, que ainda sobreviviam em populações que tinham sido superficialmente cristianizadas. Afirmava-se a autoridade e a ortodoxia representada pela Igreja Católica que, gradualmente, ocupava o vazio de poder se estabelecia na medida em que desaparecia qualquer vestígio de poder político centralizado.


O SURGIMENTO DA FILOSOFIA ESCOLÁSTICA

No Natal do ano 800 o papa Leão III coroou Carlos Magno como novo soberano do Império Romano do Ocidente, como se fosse possível ressuscitar um império que havia desmoronado há mais de três séculos. Mas de fato, com o Império Carolíngeo parecia renascer a lei e a ordem na Europa, depois de um longo período de caos marcado pelas guerras, fome e pestes. E a vida cultural refletia esse novo momento. Carlos Magno fundou escolas e atraiu vários sábios para a sua corte: EGINHARD, ALCUÍNO DE YORK, PEDRO LOMBARDO E PAULINO DE AQUILÉIA. Além da Escola Palatina, muitas outras foram instaladas em mosteiros ou igrejas, e muitas das obras da antiguidade, que ali estavam guardadas, voltaram a ser divulgadas. A partir do chamado renascimento carolíngeo a cultura greco-romana voltou a influenciar o pensamento do mundo ocidental. Nas escolas, organizadas nos moldes da educação romana, se ensinava gramática, retórica e dialética (trivium) e também geometria, aritmética, astronomia e música (quatrivium). Em seguida, os estudos dirigiam-se para a Teologia.
Depois do século XI, com o aparecimento das universidades em Paris, Oxford, Coimbra, Salamanca, Colônia e outras, surgiram também os cursos de Direito, Medicina e, mais tarde, o curso de Artes e Ofícios. Foi no ambiente cultural dessas escolas e primeiras universidades que surgiu uma produção intelectual de caráter filosófico-teológico que passou a ser chamada de Escolástica. Com o movimento das Cruzadas e a reabertura do Mar Mediterrâneo para o comércio com o Oriente, intensificaram-se os contatos com o mundo bizantino e a cultura muçulmana. Os europeus traduzem várias obras de Aristóteles e seu pensamento penetra rápida e profundamente nas reflexões dos escolásticos. O aristotelismo foi adaptado aos princípios do cristianismo e, apesar de ser inicialmente condenado, acabou embasando o pensamento adotado pela Igreja Católica.
O renascimento comercial e urbano na Europa, por outro lado, trazia consigo o surgimento de uma nova classe social, a burguesia, e com ela uma nova visão do homem, do mundo e da vida. Novos valores, novas idéias e novas demandas que prenunciavam o nascimento do mundo moderno. Nas universidades, inicialmente dominadas pela teologia, aos poucos nasceu um pensamento crítico e especulativo, e o estudo da lógica ganhou força, embora a questão central do pensamento escolástico tenha sido sempre o desafio de conciliar a fé com a razão, a religião com a filosofia. Um dos grandes temas da filosofia medieval, que envolveu inúmeras “disputas” e a intermináveis polêmicas, foi a chamada “Questão dos Universais”, ou seja, a relação existente entre as palavras (ou conceitos) e as coisas que elas representam.

Comentários