História das Crises Econômicas(3)


AS CRISES E A ECONOMIA POLÍTICA CLÁSSICA


O Liberalismo Econômico

Foi com os pensadores do século XVIII que nasceu efetivamente a ciência econômica clássica. Entre os fundadores da economia política estão os fisiocratas franceses como François Quesnay (O Quadro Econômico) e os economistas liberais ingleses. Entre esses últimos devemos destacar: Adam Smith (A Riqueza das Nações) que fundamentou a teoria do valor-trabalho, David Ricardo (Princípios de Economia Política e Tributação) que, entre outras formulou uma lei “científica” dos salários e ainda John Stuart Mill (Princípios de Economia Política), defensor de uma doutrina denominada utilitarismo.
Esses pensadores formularam os princípios básicos do Liberalismo Econômico, defendendo o direito individual à propriedade e à liberdade de produzir. Criticaram a intervenção do Estado na Economia condenando as práticas protecionistas e os monopólios. Consagrando a doutrina do “laissez-faire”, ou seja, da livre iniciativa e afirmaram que a livre concorrência e a competição eram fatores fundamentais para o desenvolvimento econômico. Acreditavam que bastava respeitar às leis de mercado para que o progresso econômico ocorresse naturalmente. É interessante observar, ainda, que no pensamento econômico liberal não existe conflito entre os interesses individuais e sociais. O que beneficiasse os indivíduos, segundo eles, beneficiaria também o conjunto da sociedade.


A concepção liberal das crises

Os primeiros pensadores liberais viveram num momento de ascensão econômica e entusiasmo, em que a Revolução Industrial afirmava o capitalismo e a sociedade burguesa. Por isso mesmo, não se detiveram na questão das crises econômicas e estavam mais preocupados em desvendar e difundir as “leis naturais” da economia. Mesmo durante o século XIX, quando se manifestaram crises de grande intensidade na Europa, os economistas liberais continuaram acreditando que as crises significavam apenas “ajustes de mercado”. Viam as crises como coisa passageira, um re-ordenamento mais ou menos dramático do sistema econômico mas que não implicavam mais do que algumas falências e concordatas. Fiéis ao princípio de que “leis naturais” guiavam e regulavam a economia, achavam que o único remédio para as crises era esperar que as condições se “normalizassem”.
Thomas Malthus, autor de Ensaio sobre a população, foi uma exceção nesse quadro de otimismo que predominou entre os pensadores de sua época. Detectou um descompasso entre o ritmo de crescimento da produção, que se daria numa progressão aritmética, e o crescimento populacional, que se daria numa escala geométrica. Inaugurou uma tendência muito comum entre os ideólogos do liberalismo, ou seja, a responsabilizar os próprios pobres pela sua miséria. A solução para esse desequilíbrio, apontada pelo pastor que condenava as leis que previam ajuda aos miseráveis sem trabalho, era “favorecer” as forças da natureza que faziam crescer a mortalidade entre os pobres (as doenças), além de pregar a abstinência sexual entre eles. Na concepção malthusiana as guerras, a fome e as pestes eram “necessárias” ou, pelo menos, cumpriam um papel positivo ao restabelecer, periodicamente, o equilíbrio entre produção e consumo.

1848 - A primeira grande crise do capitalismo

Foi a primeira crise de dimensões continentais e ocorreu no momento em que a economia capitalista começava a se afirmar na Europa. Ela se manifestou de maneiras diferentes em função do nível de desenvolvimento do capitalismo em cada região. Na Inglaterra, na França e em regiões da Alemanha, ela se manifestou especialmente no setor industrial, enquanto em países como a Irlanda ou a Itália a crise partiu do setor agrário. De qualquer modo, ela mostra que o grau de interdependência entre as atividades econômicas e entre as economias regionais da Europa já era bastante forte. Como o capitalismo ainda era um fenômeno basicamente europeu, a crise só atingiu outras partes do mundo indiretamente.
A situação econômica foi se complicando desde o início da década, mas foram as péssimas colheitas, a partir de 1846, que deflagraram de vez a crise. Os preços dos produtos agrícolas subiram muito rapidamente gerando fome e fazendo aumentar o descontentamento das camadas mais pobres da população. Por outro lado, a produção industrial que tinha crescido rapidamente com as inovações tecnológicas, especialmente a indústria têxtil, começou a gerar superprodução e, sem conseguir escoar seus produtos, entrou em crise. O empobrecimento dos camponeses, por sua vez, contribuía ainda mais para a retração do mercado consumidor de produtos manufaturados.
Muitas fábricas foram à falências e as greves e o desemprego se multiplicaram. As manufaturas que não quebraram tiveram que reduzir os salários dos operários, o que só piorava as coisa, num momento em que os preços dos gêneros de primeira necessidade tinham se elevado bastante. Pressionados pela fome e pelo descontentamento popular muitos governos foram obrigados a destinar recursos para a importação de trigo, o que reduzia os gastos com obras, os investimentos em ferrovias ou a compra de armamentos, por exemplo. O resultado foi uma forte retração dos investimentos e do crédito e, por conseguinte, a estagnação econômica.
Esse quadro de crise econômica generalizada foi o fator determinante para desencadear uma onda revolucionária que sacudiu praticamente todo o continente no ano de 1848, e que ficou conhecida como a “Primavera dos Povos”. É verdade que em cada região da Europa a revolução foi condicionada por elementos políticos e ideológicos específicos e que tiveram desdobramentos diferentes. Setores da burguesia liberal se aliaram com os socialistas para derrubar a monarquia corrupta de Luis Felipe e proclamar uma II República na França. Na Alemanha e na Itália, onde o liberalismo se fundiu com o nacionalismo, se deram tentativas fracassadas de unificação política, que só se completaria definitivamente em 1870. As massas populares participaram desses movimentos quase sempre por causa do desespero gerado pela fome e pelo desemprego, ou ainda pela promessa de direitos e cidadania, mas não possuíam organizações políticas próprias, sendo conduzidas ou manobradas pelos setores da burguesia e da pequena burguesia.

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