História da Filosofia: Sócrates e os Sofistas


Em meados do século V a.C., a Grécia vivia seu momento de esplendor, especialmente depois da vitória sobre os persas, numa guerra que se prolongou por décadas. Atenas estende sua influência sobre todo o mundo grego e transforma-se na “escola da hélade”. O comércio e o artesanato trouxeram enorme prosperidade e a cidade passou a atrair sábios e artistas. Assentada numa base econômica escravista, onde os “instrumentos vocais” realizavam todo tipo de trabalho e produziam toda a riqueza, a democracia ateniense atingia seu apogeu. Os poucos cidadãos livres de Atenas podiam, então, se dedicar ao ócio, ao esporte, à guerra ou aos assuntos da pólis. Foi neste contexto que surgiram os sofistas e, também, um pensador que seria um marco na história da filosofia: Sócrates.


OS SOFISTAS

Os primeiros filósofos haviam voltado seus esforços para uma compreensão racional dos fenômenos da natureza. Agora, numa nona fase, a filosofia começava a voltar-se para o próprio homem e para as questões da sociedade. Os sofistas foram sábios e professores que se instalaram em Atenas e vendiam ensinamentos práticos de filosofia, de acordo com os interesses de seus alunos. Preparavam seus discípulos para a participação nos assuntos públicos e negócios privados, ensinando eloquência, oratória, raciocínio lógico e técnica de argumentação. Procuravam dar ao conhecimento um caráter prático e útil para as pessoas resolverem seus problemas ou atingirem seus objetivos. Isto levou os sofistas a uma concepção relativista das coisas, já que para eles, não existiria uma verdade absoluta. Tudo, segundo eles, é relativo à cada indivíduo, sociedade ou cultura em determinado momento histórico. As opiniões humanas são tantas e tão diversas, pensavam eles, que não poderiam ser reduzidas a uma única verdade. Suas idéias fundamentavam-se, portanto, numa visão bastante flexível do homem e da sociedade. Filósofos como Platão criticaram os sofistas, acusando-os de serem impostores e manipuladores, capazes de iludir e enganar as pessoas com raciocínios aparentemente corretos, mas que, de fato, são falsos ou inconclusivos. Em outras palavras, o sofista seria um mero mercenário do conhecimento, mestre na arte de convencer ou persuadir as pessoas, sem qualquer compromisso ou preocupação com a verdade.


PROTÁGORAS DE ABDERA (480-410 a.C.), nascido no litoral da Trácia, mudou-se para Atenas onde ensinou durante muitos anos. É considerado o primeiro e, também, o mais importante dos sofistas. Sua doutrina tinha por princípio básico a idéia de que o homem é a medida de tudo o que existe. Todas as coisas seriam relativas às disposições do homem, isto é, o mundo é aquilo que o homem constrói e a realidade é o que ele compreende como tal. Além disso, cada povo e cada cultura tem uma moral própria e uma visão diferente do que é certo e do que é errado, do bem e do mal, do belo e do feio etc.


GÓRGIAS DE LEONTINI (487-380 a.C.) , discípulo de Protágoras, é considerado um dos maiores oradores de sua época. Levou o subjetivismo relativista de seu mestre ao extremo, a ponto de defender um ceticismo absoluto. Górgias entendia que tudo no mundo é circunstancial e que, por isso, qualquer hipótese pode ser virtualmente defendida. Afirmava que nada existia e, se existisse, não poderia ser conhecido ou comunicado.



SÓCRATES: UM MARCO NA HISTÓRIA DA FILOSOFIA

SÓCRATES (470—399 a.C.) nasceu nas proximidades de Atenas e é considerado um verdadeiro marco na história da filosofia. Não deixou nada escrito e o que sabemos dele e de seu pensamento nos chegou através de seus discípulos e de outros filósofos. Sócrates, porém, nunca pretendeu elaborar uma doutrina ou coisa semelhante. O que esse pensador inquieto fazia era perguntar coisas diferentes, e muita vezes embaraçosas. O que é a verdade? O que é a justiça? O que é o bem? E a coragem? E a beleza? E assim por diante.
Embora não vendesse seus conhecimentos ,tal como os sofistas Sócrates também voltou suas reflexões para a problemática do homem e se dirigia aos jovens nas praças e lugares públicos. Ensinava que era preciso aproximar a vida material e espiritual, unir a realidade concreta ao pensamento, o saber ao fazer. Para ele, a consciência intelectual (razão) e a consciência prática (moral) deviam se tornar um só “eu consciente”. Nesse ponto, Sócrates discorda radicalmente dos sofistas, quanto ao seu relativismo moral ou sua disposição de usar a retórica para atingir interesses particulares. Queria descobrir o significado verdadeiro das coisas e não se contentava com as aparências ou conveniências. Buscava encontrar a essência do homem e acreditava que através da razão podemos chegar à verdade. Só que para isso, afirmava ele, antes de mais nada o homem deve buscar o autoconhecimento. “Conhece-te a ti mesmo” costumava dizer o grande sábio aos discípulos.
Sócrates utilizava como método para desenvolver sua filosofia o chamado diálogo crítico com seus interlocutores. Esse se dividia em dois momentos: a ironia (interrogação) e a maiêutica (trazer à luz). No primeiro momento, o filósofo indagava as pessoas sobre aquilo que ela pensavam saber. Argumentando habilmente ele desfazia, aos poucos, as certezas de seu oponente e mostrava as incoerências de suas afirmações. Através da ironia, portanto, Sócrates demolia os preconceitos e a presunção de seu opositor fazendo-o perceber a contradição ou limitação de suas idéias. Mas fazia isso com humildade e consciência da própria ignorância. “Só sei que nada sei” reconhecia o filósofo. Liberto do orgulho e da pretensão de que algo ou tudo sabia, seu interlocutor tinha, agora, a possibilidade de começar a construir suas próprias idéias e a formular suas concepções de maneira mais fundamentada e coerente. Nesse segundo momento, a maiêutica, Sócrates ajudava seus discípulos propondo-lhes uma série de questões que metodicamente colocadas, lhes permitiam conceber uma nova visão das coisas, purificada pela crítica.
Acusado pelas autoridades de Atenas de desrespeitar os deuses e corromper a juventude com suas idéias e comportamento, foi condenado a abandonar a cidade ou beber cicuta (veneno). Enfrentou o julgamento altivo e imperturbável. “Estás enganado se pensas que um homem de bem deve ficar pensando, ao praticar seus atos, sobre as possibilidades de vida ou de morte. O homem de valor moral deve considerar apenas, em seus atos, se eles são justos ou injustos, corajosos ou covardes” teria afirmado ele aos seus acusadores e discípulos. Viveu de acordo com sua consciência e morreu sem renunciar aos seus valores e idéias.

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